Projeto casamento

Projeto casamento

O maior desafio do casamento não é “serem felizes para sempre” e sim serem capazes de enfrentar cada dia juntos, sentindo que a vida do casal faz sentido. Para o “projeto casamento” ter sucesso, é necessário fazer dele um empreendimento sustentável. E isso passa, em grande medida, por encontrar no parceiro ou parceira alguém que te ajude a ser uma pessoa melhor do que era.

Dividir com o outro a vida e as suas consequentes dificuldades é muito mais natural quando há o exercício da empatia na relação. No texto que publiquei na semana passada, destaquei que uma postura empática só é possível quando me dispo de mim e crio espaço para o outro. Só depois que eu me sinto por meio dele que é possível voltar a mim com a capacidade de interagir com esse outro.

Só que a empatia normalmente só é alcançada depois de um consciente processo de escuta. Ele é a chave que destrava os cadeados do diálogo, permitindo que este se estabeleça como regra no casamento.

 

Projeto casamento: uma complexa construção que não se forma pela simples soma das partes

Relacionamentos sólidos são construídos e reforçados em cada ação de um para o outro. Nenhuma construção duradoura resiste a tijolos ou pilares frágeis, pouco confiáveis. E nenhum relacionamento vai se sustentar por muito tempo se os envolvidos não conseguirem confiar um no outro, não conseguirem acreditar que as ações tomadas ali buscam o crescimento da relação.

Quando destaquei a importância da escuta e diálogo no casamento, me veio à mente as conversas entre casais. Em boa parte delas, apontar as falhas parece algo muito natural. Reclamar que você desarrumou aquilo, deixou de fazer tal coisa, atrasou ou postergou algo, que falta isso ou aquilo…

Por outro lado, uma prática que é absolutamente legitima anda muito pouco usual: elogiar a parceira ou o parceiro. E quando digo “elogio”, não quero que soe como bajulação nem nada com uma natureza manipulada. Falo sim do elogio sincero; esse costuma ser bem escasso.

Destacar que um corte de cabelo rejuvenesceu, como está gostoso esse prato que você fez, como adoro esse carinho que você me dá, o jeito como você me deixa com tesão, o orgulho que sinto diante da admiração das pessoas pelo seu trabalho, como é lindo ver você brincando com nossos filhos e por aí afora…

As reclamações, os juízos de valor sobre as falhas, eles vão acontecer. Mas se eles se transformam no foco, você vira um chato ou uma chata qualquer. E um chato ou chata qualquer não acusa a pessoa que está ao seu lado. Nem a coloca para baixo.

A pessoa que acolhe, aceita o outro como ele é e demonstra seu bem-querer para com ele.

Claro que faz parte da vida, dizer “não quero”, “não vou”, “não gosto”, “não posso”. É necessário falar dos incômodos que surgem na convivência. Só que há uma virtude em certas formas de expressar suas inquietações e incômodos. As que tem mais chances de sucesso são resultado da soma entre uma forma de expressão habilidosa e cuidadosa com o senso de oportunidade.

Mas o mais importante para pensar nessa forma de interagir é ela não deve reprimir sua liberdade de expressão. Com amor, qualquer verdade pode ser dita. E escolher onde, como e quando dizer, faz de quem diz um sábio.

Todos os movimentos no sentido de viabilizar e dar significado a um bom relacionamento são extremamente pertinentes na vida de um casal. Mas se inconscientes das nossas atitudes para com o outro, vai ser mais fácil destruir que construir o “projeto casamento”.

Uma relação, que às vezes demora longos anos para ser construída pode num curto período de tempo ser destruída. Basta recheá-la de intolerância, acusações e julgamentos.

Mais fácil que construir talvez seja fazer ruir o “projeto casamento”.

 

Num projeto em construção ou reforma, qual apoio a terapia de casal pode oferecer?

A intenção, em parte, explica a ação. O que justifica a procura pela terapia de casal é o que os envolvidos querem, esperam daquele relacionamento. Esse desejo norteará o atendimento ao casal.

Cabe à terapeuta buscar lançar luz aos acontecimentos presentes na forma de viver do casal. Lidar com hábitos e comportamentos favoráveis e distorcidos no cotidiano, as expectativas de cada um em relação ao outro e quanto elas estão sendo atendidas ou frustradas.

A terapeuta ganha do casal a permissão para encorajá-lo a mergulhar o mais profundamente na relação, até encontrar o ponto no qual ela colocará seu apoio. É aí que a terapeuta começa a ajudar ao casal a compreender melhor suas questões e ser capaz de tomar as decisões.

Não cabe à terapeuta orientar o que o casal deva fazer ou julgar, quem está certo ou errado. Ela não é juíza ou carrasca. Suas funções são duas: primeiro atuar como mediadora, ajudando o casal a se expressar e se escutar. Depois ir devolvendo a ele as situações mais tipicamente apresentadas a partir da percepção da terapeuta.

Essa percepção é gerada a partir da interpretação da interação de ambos, da forma como o casal abordou as suas narrativas e das outras informações coletadas ao longo de todo processo terapêutico.

A ideia é oferecer ao casal mais clareza sobre seu próprio funcionamento, promovendo uma real conscientização e responsabilização de cada um pela dinâmica da relação.

A postura da terapeuta não é de se posicionar a favor ou contra a continuidade do casamento e sim, contribuir para o casal ter condições de decidir de forma madura o que farão de suas vidas.

A continuidade certamente exigirá planos de mudança, da aposta na reconstrução do “projeto casamento” – que nada mais é do que a reconstrução da própria vida dos dois enquanto um casal.

E se a decisão for a separação, que ela possa ser concretizada sem precipitação e aproveitando todo o processo de diálogo ocorrido na terapia. Assim aumentam-se as chances de se realizar uma separação respeitosa e saudável, evitando sequelas desnecessárias. Essa “economia de sofrimento” pode ser decisiva para construir um “pacto com a sabedoria” – que poderá ser muito útil para o futuro da vida dos dois.