Terapia individual

 

A única forma de escaparmos da vitimização é assumirmos nossas escolhas.

Olhar para a nossa vida é olhar para nossas escolhas e pela forma como as vivemos: o que fazemos, pelo que lutamos, do que abrimos mão e com quem vivemos, diz muito sobre quem somos.

Pode aparentar muito assustador quando não gostamos do que vemos. Mas pode ser profundamente libertador quando as próprias lacunas e marcas que nos frustraram e machucaram formam o caminho da esperança, usando a mesma condição de escolha para preparar um futuro muito mais próximo da nossa felicidade e das realizações compatíveis com nossos desejos.

A tão cultuada juventude, que oferece aspectos de aventura e descoberta, nos arremessa também a escolhas importantes, mas sem conhecimento de causa. Acredito que só se escolhe de verdade o que realmente conhecemos. A vida, no entanto, nos exige escolhas para as quais não fomos sequer alfabetizados.

 

Terapia individual: investigando e buscando caminhos

Na busca de desvendar e compreender a história de cada paciente, meus passeios pelas livrarias não são muito sistemáticos. Costumo me deixar levar pela intuição, atenta a sinais que me chamem.

Num certo dia esbarrei não com um livro, não com um autor, mas com um título: Profunda simplicidade. Tamanho foi o impacto gerado em mim pela combinação dessas palavras que, ao folhear o livro, não conseguia me concentrar nos recados dados por Will Schutz. Pedi consentimento ao autor que, ao menos por um tempo, permanecesse com o livro fechado e me permitisse ficar encantada, explorando minha sensação.

É que essas duas palavras me arrebataram pela força e importância de cada uma. E ao vê-las juntas, descortinaram-se à minha frente as respostas a tantos dilemas humanos que vinha encontrando nos meus atendimentos de terapia individual.

Quando penso em profundidade, reconheço meu interesse inesgotável de investigar as nuances que percorrem as idiossincrasias do ser humano. Mas essa dimensão, que a mim parece muito convidativa, às vezes assusta. Por vezes trato esse mergulho na dimensão humana com tanto esmero que quase a torno inatingível e sem saída, trocando aquela atração inicial por algo assustador.

Na outra ponta temos a simplicidade. Esta associo à ideia de leveza, positividade e com grande tendência a descomplicar as questões. Pois é justamente aí que a dialética se apresenta – e me alerta – para o grande risco: o da simplicidade tornar-se o simplório, o simplismo, ficando rasa demais e boiando na superfície das questões que exigem elaboração muito maior.

 

A sinergia das palavras

Eis que ao encontrá-las de mãos dadas, minha mente deu uma clareada e só me vinha a repetição do título Profunda simplicidade. Quando elas se avizinham, a profundidade toma emprestada a leveza e naturalidade da simplicidade. Por sua vez a simplicidade, encorpada pela intensidade da profundidade, atreve-se a um mergulho em águas nunca dantes navegadas.

Voltando à terapia individual, cada vez que abro a porta do meu consultório, procuro abrir também minha mente e meu coração para o que vai chegar. Muitas vezes o paciente está perdido com escolhas que fez, deixou de fazer ou precisa fazer. Afinal, quase tudo são escolhas. Até mesmo quando surgem questões circunstanciais, somos nós que escolhemos quando e como vamos agir com elas.

Entre minhas especulações com o pensamento, sinto por vezes que essa liberdade de escolha é a maior dádiva do homem e, ao mesmo tempo, sua principal angústia. Grande parte das vezes não estamos preparados para escolher.

 

Na corda bamba da existência

“Arriscar-se é perder o equilíbrio por uns tempos… Mas não se arriscar é perder a si mesmo”.
Kierkgaard

É assim que a vida nos oferece o fio sobre o qual nos equilibrar: sem acrescentar as redes de proteção.

 

“Tudo foi planejado, exceto como viver”.
Sartre

E então, diante de nossas escolhas: travamos ou vamos em frente?

Tamanha é a complexidade – mas em idêntica proporção é a simplicidade – do existir, que ficamos atordoados procurando respostas. A busca da terapia individual, longe de nos aliviar com essas respostas, poderá ampliar e problematizar nossas questões. Em última instância, vai encorajar esse sublime encontro com o si mesmo, iluminar cantinhos obscuros que nos desvelem a magia da subjetividade e permitir a maior de todas as intimidades possíveis: o encontro, a nu, com sua essência.

Já li que a definição de insanidade é buscar resultados diferentes repetindo as mesmas práticas. O processo de terapia individual vai desarmando, na relação terapeuta-paciente, essas armadilhas e confirmando, mais uma vez, a filosofia de Kierkgaard: “pior mal é aquele ao qual nos acostumamos”.

Percebo a terapia, seja individual ou de casal, uma vereda importante na ruptura desses condicionamentos e na exploração da riqueza de construir escolhas saudáveis.