Instintos no Eneagrama

Instintos no Eneagrama

Compreender a totalidade do ser humano exige que olhemos para nossos instintos, a nossa parte animal. Atuando muito além dos nossos campos emocionais ou mentais, os instintos se antecipam à razão e à emoção, sobrepondo-se às forças de ambas, como se tivessem vida própria. E ao tomarmos o caminho da análise das personalidades por meio de um complexo sistema de estudo, vamos também nos desdobrar para entender a forma como são tratados os instintos no Eneagrama.

Instintos são uma disposição persistente do organismo a agir de maneira organizada ou biologicamente adaptativa, como se fosse uma tendência do ser. Esse mecanismo, essa força instintiva, é uma das evidências da evolução da espécie humana.

Três importantes características dos instintos humanos são sua insaciedade, sua imensa energia e sua autonomia. E como são governados (ou desgovernados) pelo nosso inconsciente, os instintos escapam da nossa percepção e, consequentemente, do nosso controle.

Por se tratarem de pulsões não racionais, os instintos atuam sem consciência imediata, sem previsão tanto de onde sua ação poderá chegar quanto das suas consequências. Assim, influenciam diretamente os nossos comportamentos, impactando bastante os relacionamentos interpessoais.

Ao nos conscientizarmos da existência dos instintos no Eneagrama, descobrimos o quanto eles poderão contribuir para o nosso desenvolvimento e amadurecimento se, pelos menos parcialmente, conseguirmos nos assenhorar da sua presença. Podemos aprender a mudar de estratégias e usar toda a energia dos instintos ao nosso favor.

 

Sobrevivência, segurança, proteção: o “primitivismo” da autopreservação

Dos instintos no Eneagrama, o de autopreservação é o mais básico, primitivo e presente instinto. Sua motivação está preponderantemente voltada para as questões relacionadas à sobrevivência e à segurança material.

Esse instinto opera em nós um permanente estado de alerta diante do risco de escassez, mantendo-nos atentos para a possibilidade da privação parcial ou total de recursos, seja para o dia a dia, seja para a evidente continuidade da vida.

Naturalmente a autopreservação nos direciona para a busca de segurança, bem-estar e conforto. Assim, se deixarmo-nos guiar eminentemente por esse instinto, podemos nos colocar diante de um excesso de precaução para a possibilidade da falta de recursos, vivendo sob alerta, como se nossa vida estivesse predominantemente ameaçada.

Do ponto de vista comportamental, o indivíduo que tem a autopreservação como instinto dominante é aquele que lota a dispensa de alimentos diante do risco de escassez. Como tende a buscar bem-estar e conforto, esse instinto pode operar na organização do ambiente físico. No trabalho, a autopreservação pode nos ajudar a focar, uma vez que ela nos direcionará para uma valorização do salário e a segurança.

Já pessoas que tem o instinto de autopreservação muito reprimido podem desenvolver desinteresse em se cuidar, às vezes como se fosse uma criança. Podem negar cuidados com alimentação, higiene, saúde, etc. Também podem desenvolver tendência em desprezar a estrutura familiar, o dinheiro, o trabalho ou a segurança, descuidando-se dos aspectos relativos à sobrevivência.

Quando ingressa em seu processo evolutivo, um indivíduo pode usar a energia da autopreservação para diversos benefícios próprios, principalmente para lidar com a ansiedade provocada pelo temor da escassez futura.

 

Instintos no Eneagrama: como o social opera em nós

O ser humano constrói a sua imagem integrando fragmentos diversos da percepção, que recebe dos outros, de si mesmo. Se um indivíduo não fosse capaz de dar importância a esse outro, estaria praticamente impedido de integrar as várias percepções a seu respeito na formação do seu eu, ficando esvaziado do melhor de si, que é a dimensão humana.

É o nosso instinto social que nos impulsiona a experimentar sensações de pertencimento. Graças a ele reconhecemos a interação como parte da nossa existência e recebemos o outro em nossos grupos sociais, entendendo-os como vitais para nós mesmos.

Da repressão à dominância, o instinto social afeta diretamente os nossos comportamentos. Quando reprimido, podemos tender ao egoísmo, ao baixo interesse e respeito pelo outros – muitas vezes sentido culpa ou vergonha nas interações. Quem tem o instinto social reprimido costuma ser antissocial, criando situações de isolamento. Além disso, ao desprezar a relevância do outros, pode-se colocar a indiferença no lugar que deveria ser ocupado pela empatia, gerando uma série de prejuízos na convivência com outras pessoas. No trabalho, por exemplo, esse tipo de comportamento pode impedir o trabalho em equipe.

Por outro lado, quando o instinto social é dominante a ponto de ser exacerbado, ele pode levar a um excesso de vaidade. O indivíduo levado eminentemente pela pulsão do instinto social pode sentir necessidade de influenciar, de se sentir importante, de ser reconhecido.

Ao avançar no processo evolutivo para desenvolver seu instinto social, o indivíduo torna-se alguém mais idealista, que abraça causas, chegando ao ponto de fazer sacrifícios pessoais para buscar ajudar a construir uma sociedade melhor.

 

O instinto sexual e seu funcionamento em nós

Nosso instinto sexual é o que entremeia nossas interações “um a um”, possibilitando a valorização da relação com cada indivíduo. Quando impulsionados pelo nosso instinto sexual, conseguimos entrar em conexões fortes com um outro indivíduo.

Pessoas que tem o instinto sexual reprimido podem criar a autopercepção de serem murchas, pesadas, nada interessantes e, consequentemente, sem vida. Essa pulsão pode provocar uma baixa autoestima uma vez que o indivíduo, não se achando atraente, encontra dificuldades para cuidar de si. Ao reduzir a energia para si mesmo, o indivíduo sexual reprimido encontra dificuldades em se conectar consigo, impedindo desenvolver percepção sobre quais são suas verdadeiras questões.

Olhando para os comportamentos, a repressão ao instinto sexual – por também gerar uma incapacidade de se conectar a um outro – pode desaguar num receio a uma verdadeira aproximação. Esse limitante pode gerar duas consequências aparentemente antagônicas: uma sensação de inadequação ao exercer a intimidade, limitando o exercício da sexualidade, ou o desenvolvimento de conexões efêmeras com muitos, pavimentando o caminho para a promiscuidade sexual.

Seja pela dificuldade de conectar consigo mesmo ou com um outro, o indivíduo que tem o instinto sexual reprimido desenvolverá uma certa incapacidade de se concentrar, tornando-se muito disperso.

Por outro lado, indivíduos com instinto sexual dominante podem, a partir da força que colocam nas conexões, desenvolver ciúmes desmedidos pelo outro, seja na vida pessoal ou profissional. Como o outro vira o todo, o indivíduo sexual dominante pode tornar-se intenso, estourado e até imprevisível.

Já quando ingressa num processo evolutivo e consegue desenvolver-se, a pessoa sexual dominante conseguirá acessar grupos, transformando-se num excelente ouvinte de cada pessoa por vez, diminuindo a dispersão e viabilizando conexões fortes.